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Comércio Internacional – Impacto do PIB em nossas vidas

 

Uma jovem camponesa decide largar seu vilarejo natal e ir trabalhar em uma fábrica da cidade, seguindo o caminho trilhado por muitos de seus amigos de sua geração que, apesar de amar o local onde viviam, não viam ali perspectiva de crescimento ou até de sobrevivência.

Ao chegar na cidade, suas expectativas de obter uma boa vida e proporcionar um conforto financeiro aos seus pais foram diminuindo aos poucos. Ao chegar na fábrica, esta jovem se deparou com uma carga horária de 15 horas por dia e um salário médio de 3 dólares ao dia (menos de R$300 mensais em valores atuais).

Seus sonhos foram aos poucos se enquadrando em uma dura realidade em que outros milhões de trabalhadores também vivem atualmente. O que parece uma narrativa da Europa nos anos 1750, na realidade, é o depoimento de Weng Qi, uma cidadã chinesa de 21 anos, que é o retrato de milhões de trabalhadores na China de hoje.

Estima-se que quase 8 milhões de famílias chinesas trabalham em condições semelhantes às de Weng Qi nas grandes cidades, como Xangai, Beijing e Shenzhen. Nestas cidades, a oferta e as condições de trabalho da classe operária são precárias, em sua maioria.

Por outro lado, há previsões otimistas sobre o crescimento da população de classe média. Segundo dados da consultoria McKinsey, até o ano de 2022, 75% de sua população urbana receberá ganhos entre 60.000,00 e 290.000,00 Renminbis anuais, o que daria algo entre R$30.816,00 e R$90.917,64, em valores atuais.

Veja o gráfico da evolução da estrutura populacional da China por classes até 2022:

Nesta previsão, é possível notar que a China estará em 2022 com um cenário que reforça os eventuais esforços do governo chinês sobre sua política salarial e fiscal para as populações urbanas.

Para compreendermos melhor como se dá a estrutura das classes sociais urbanas na china, vejamos como se dividem as faixas salariais dos chineses. Os valores foram convertidos de RMB$ para R$ e em ganhos mensais, para facilitar a compreensão:

Percebemos a distribuição de faixas salariais para a população chinesa, onde os mais pobres ganham até R$2.568,00 mensais e os mais ricos a partir de R$ 9.760,00 mensais. Importante ressaltar que as métricas que definem as classes sociais variam naturalmente de país para país por diversos fatores socioeconômicos e culturais, ou seja, o que pode ser visto como pobreza para a população dos EUA, onde a linha limítrofe da pobreza é de US$24.000,00 anuais por família, para um país como a China (ou até mesmo para o Brasil) é tido como a remuneração de uma classe média alta.

Mas, falar da economia chinesa (ou simplesmente compreendê-la) não é uma tarefa simples. A China adota uma política econômica que possui estruturas capitalistas, mas é controlada por um regime comunista austero, que por sua vez dificulta o acesso à informação sobre seus dados socioeconômicos e demais estruturas administrativas. Não raro, existem consultores financeiros alocados na China única e exclusivamente para estudar se os dados informados oficialmente pelo governo fazem jus à realidade vivida neste país.

O que sabemos é que a China hoje mantém fortes laços comerciais com os EUA, Europa e América do Sul, além de trabalhar como financiador direto de políticas públicas de alguns países da África. Este misto de políticas econômicas faz com que a China seja um ótimo exemplo para falarmos de um país cuja economia é baseada no saldo da Balança Comercial (X-M).

Mas como um país, que até poucas décadas atrás era considerado um dos países mais fechados do mundo, se torna, além de um dos principais parceiros comerciais do ocidente, a segunda maior economia do mundo? Vejamos mais atentamente a sua inserção na economia mundial.

O processo de abertura econômica da China começou em 1979, e os pilares que sustentavam esta política eram:

  • aumentar a participação do país no comércio internacional;
  • favorecer seu acesso às fontes externas de capital e tecnologia avançada;
  • introduzir modernas técnicas administrativas nas empresas chinesas (ACIOLY, 2005, p.27 citado por Lemoine, 2000).

Na prática, o primeiro passo do governo chinês foi criar zonas de Interesse econômico (conhecidas como Zonas Econômicas Especiais – ZEEs), em quatro cidades, Shenzhen, Zhuhai, Xiamen e Shantou, onde incentivos fiscais e até isenções tarifárias eram os principais atrativos para que empresas estrangeiras se estabelecessem nestes polos.

A pesquisadora do IPEA, Luciana Acioly (2005, p.28), destaca que o sucesso deste modelo permitiu que polos em outras cidades pudessem ser construídos. Além disso, proporcionou o crescimento e estruturação do modelo de negócios para que houvesse mais segurança na permanência destas empresas. Tudo bem controlado pelo regime, pois nenhuma empresa poderia ser chamada de privada neste período. Este conceito só foi flexibilizado após a entrada da China na OMC em 2000.

Em resumo, o processo de abertura econômica se deu da seguinte forma: a China ofereceu capital humano, estrutura física e isenção de impostos, enquanto as empresas estrangeiras entraram com o aporte de capitais. Para evitar uma evasão de divisas foram estipuladas cotas mínimas de exportação dos produtos além dos perfis das empresas participantes, em geral manufatureiras e fabricantes de produtos tecnológicos de inovação.

Com mais reservas financeiras e um controle rígido das exportações, a China obteve, ao menos nos últimos 20 anos, um crescimento médio de 7% ao ano. Estes recursos astronômicos, além de serem utilizados para o desenvolvimento de um país de números também astronômicos, é utilizado para estabelecer parcerias com outras economias emergentes através de empréstimos e financiamentos.

A China é o principal financiador de diversos países africanos, como Angola, Botswana e demais países da África subsaariana, onde em troca de matéria-prima estes países recebem investimentos em infraestrutura.

Resgatando a Identidade macroeconômica, Y = C + I + G + (X – M), diferentemente dos outros países estudados anteriormente, o preponderante na economia chinesa é o saldo de importações e exportações (X – M), justamente por manter estas relações intensivas de troca com os outros países, seja de commodities, manufatura ou Investimento Direto Estrangeiro (IDE).

O saldo positivo em sua balança comercial é o que permite maiores reservas financeiras, consolidando seu poder de negociação e intervenção na economia mundial. A qualquer sinal de oscilação negativa de sua bolsa de valores, os mercados do resto do mundo entram em pânico.

Não poderia ser diferente, pois ao contrário de muitas outras bolsas de valores, a bolsa de Xangai é composta em sua grande maioria pelos chamados pequenos investidores, que são pessoas físicas que optam por investir no mercado financeiro. Qualquer queda nestes índices reflete diretamente no seu poder de compra.

A China soube utilizar seus principais fatores produtivos a seu favor. Consolidou-se como parceiro comercial estável e, assim, atraiu Investimento Estrangeiro Direto de forma que ele não evadisse facilmente. Podemos dizer que a China seguiu a mesma trajetória que o Brasil até a década de 80, mas em algum momento as escolhas políticas foram distintas.

Somos historicamente conhecidos como exportadores de commodities e importadores de bens e serviços, o que nos deixa também extremamente sensíveis às nuances do mercado financeiro internacional, mas não temos a austeridade do regime chinês na retenção dos IDE’s.

Para saber mais:
Depoimento de Weng Qi extraído do documentário Wal-Mart: The High Cost of Low Price. Dir. Robert Greenwald. 2005. [O documentário pode ser encontrado no youtube <http://bit.ly/1zE8cGc> ou no Netflix, para assinantes].
Mapping China’s middle class – http://bit.ly/1eAJfBl
Banco Mundial – http://bit.ly/1TsUPmX
Câmara chinesa de comércio no Brasil – http://bit.ly/1Gf2Qma
O comércio exterior na universalização da política externa chinesa no século XXI – http://bit.ly/1Hz8nVE
ACIOLY, Luciana. China: uma inserção externa diferenciada. Economia Política Internacional: Análise Estratégica, n.7 – out./dez. 2005. Disponível em <http://bit.ly/1TD0BT8>.
A parceria entre China e África e os impactos sobre direitos humanos e intervenção humanitária – http://bit.ly/1Hz86lz
Mercado de ações da China – http://bit.ly/1MoLKr2
Terremoto na bolsa de valores da China – http://bit.ly/1IUcyAD

Créditos das imagens:
Imagem da Capa – http://binged.it/1IUe6un
Bandeira da China – http://bit.ly/1HoRoby
Polos Industriais – http://bit.ly/1HzvejM
Made In China – http://bit.ly/1dUJImR
Presença da China na África – http://bit.ly/1JZJxVJ

Leia os demais artigos que compõem esta série clicando aqui.

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