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Fintechs e inovação: o fim dos bancos comerciais. Será mesmo?

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Por André Prado, CEO da Análise Econômica

Fala-se muito de fintechs, startups, inovação, empreendedorismo e afins. Mas essas palavrinhas mágicas carregadas de significado e otimismo na boca dos diversos “profetas” da inovação possuem uma longa história por trás.

A economia é uma ciência (para alguns, uma arte) que busca como alocar os recursos disponíveis no planeta (geralmente escassos, finitos) para atender as necessidades de cada indivíduo – que, em tese, são ilimitadas, infinitas.

Nesse processo histórico de encontrar os meios mais adequados para atender às nossas necessidades, desenvolvemos as mais diversas instituições, ferramentas e meios. Uma dessas instituições existe até hoje: os bancos.

O papel das instituições bancárias sempre foi simples: guardar as moedas da população. Nada demais, certo?

Mas essa função transformou-se ao longo do tempo. Os primeiros banqueiros olhavam para aquelas montanhas de moedas e pensavam: “Por que deixar isso tudo parado? Já que uma parcela dos clientes não vem retirar seus recursos com regularidade, posso muito bem emprestar essa parcela que fica parada”.

E aí a história ganha um novo e importante capítulo.

O papel do crédito

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O crédito, há muitos séculos, tem sido a verdadeira “forma” do dinheiro. Ou ao menos o papel mais comum que a moeda assume na economia. De todo modo, o crédito tornou-se o pilar da economia contemporânea.

No processo de buscar novas maneiras de gerir os recursos para atender às necessidades humanas, diversos indivíduos tiveram ideias geniais. Mas essas ideias não poderiam ficar somente no campo das ideias ou no papel. Elas precisavam ser testadas.

Mas como colocar essas ideias em prática? De onde tirar recursos para financiá-las?

É aí que entra o papel daqueles banqueiros “gananciosos”. A uma taxa de juros razoável, que garanta que o banqueiro possa repor o dinheiro emprestado e ainda ter algum lucro com o dinheiro que ficaria parado, esses personagens da história financiaram muitas ideias.

E os indivíduos portadores dessas muitas ideias foram os precursores da palavra da moda nos tempos modernos: empreendedorismo.

Claro, a história não é linear. Os banqueiros nem sempre financiaram ideias arriscadas. Muitas vezes tais ideias foram financiadas por “mecenas”, que nada mais eram do que nobres cheios de recursos (e entediados com seus recursos parados). Mas essa é outra história.

A jornada da inovação

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Esses empreendedores tiveram um papel importante na história. Ao buscar novas combinações de recursos para atender às necessidades dos indivíduos em sociedade, criaram a mola mestra do desenvolvimento econômico.

É essa busca por novas combinações que chamamos de inovação. Claro que isso também não vem de graça. Talvez no início, o que movia os primeiros empreendedores fosse uma legítima vontade de descobrir, de explorar, de aprender. Mas as evidências históricas nos mostram que o maior motivador foi a busca pelo lucro.

Inovar significa diferenciar seu produto ou serviço dos concorrentes. E, se for “sedutor” o suficiente para que as pessoas queiram consumi-lo, aí a inovação se traduz em maiores margens de lucro.

Mas buscar diferenciais exige muita pesquisa e desenvolvimento. E isso exige grana. Muita grana. Anos de grana sendo investida sem nem sempre ter uma noção do retorno.

Daí os “mecenas” modernos entram em cena.

Quem fez tradicionalmente esse papel foi o Estado. Mas hoje, por exemplo, é comum fundos de investimento entrarem nesse jogo. As diversas inovações ao longo da história mostraram-se bastante lucrativas.

Tá, mas e os bancos?

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Não esqueci dos bancos. Aqueles que no começo dessa história “inventaram” o crédito.

Pense comigo: se uma inovação pode levar anos para entrar no mercado e isso demanda muitos investimentos, isso significa que ela não necessariamente será barata, certo? Exatamente.

Não pretendo entrar nos detalhes técnicos sobre a questão da formação do preço. Até porque existem visões diversas e divergentes sobre esse ponto. Mas, o mais importante é que as empresas transferem esses investimentos para os preços dos produtos.

E os bancos, como qualquer outra empresa, buscam garantir o retorno do seu capital. Então, em vez de financiarem investimentos de alto risco, financiam “investimentos de menor risco”. Em outras palavras, financiam consumo.

O que pode ser menos arriscado para um banco do que emprestar 30 mil reais para um indivíduo com salário fixo todo mês para que esse sujeito compre o seu carro? É dinheiro certo todo mês!

E dinheiro “certo” rima com lucro certo. E se tem lucro, tem empreendedores inovando buscando um pedaço do bolo.

Aí entram as fintechs!

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Sejamos sinceros: quem nunca se incomodou com as taxas para tudo quanto é serviço dos bancos comerciais? Ou simplesmente precisou ir até uma agência e se deparou com filas gigantescas ou algo que gerasse uma grande perda de tempo?

Pois é!

É nesse contexto que as fintechs e startups ligadas ao setor financeiro vêm se destacando e abocanhando uma boa parcela dos clientes dos bancos comerciais. O termo fintech surgiu da combinação das palavras em inglês financial (finanças) e technology (tecnologia).

Esse nome, por si só, resume bem a ideia: fintech é toda empresa que oferece serviços financeiros que se diferenciam pelas facilidades proporcionadas pela tecnologia e, com efeito, pela internet.

Com estruturas enxutas e altamente eficientes, essas empresas conseguem operar sem muitas das taxas dos bancos tradicionais, oferecem crédito mais barato, cartões sem anuidades, atendimento online e atenção especial com a experiência do usuário.

Aliás, esse último ponto é muito importante para as fintechs. Com plataformas intuitivas e amigáveis, elas desburocratizam processos como empréstimos e aumento de limites, já que basta estar online para isso.

Inovação na veia (e lucros também)

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Já se estima que nos próximos anos, as fintechs deverão “morder” uma parcela de 20% dos lucros obtidos no setor em 2018. De acordo com o Dieese, em 2016, os 5 maiores bancos juntos chegaram a R$ 69 bilhões de lucro líquido. 20% disso é uma boa, não é?

É fato que os bancos serão superados por essas novas empresas? Pouco provável, nesse primeiro momento. Boa parte das fintechs ainda não registram efetivamente lucros em seus balanços.

Na prática, isso significa que de todo o dinheiro investido nessas empresas, os lucros que elas já registraram não foram suficientes para repor os investimentos. Chamamos tecnicamente isso de “break-even point”. E nesse caso, elas não chegaram nesse ponto.

Mas é fundamental notar que essas empresas tem um alto potencial – assim como a história já registrou em diversos casos de empresas inovadoras. E os investimentos seguem firmes, fortes e bilionários.

Multiplicam-se os casos de fintechs e outras startups do setor financeiro que registraram valores de mercado acima de US$ 1 bilhão de dólares – carinhosamente apelidadas de “unicórnios”. É o caso de Nubank, PayPal, Guiabolso, Ebanx, Stone Pagamentos e outras.

E detalhe: a boa parcela dessas empresas são brasileiras ou possuem capital nacional. Quem disse que brasileiro só se destaca no futebol?

Então as fintechs acabarão com os bancos comerciais?

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É pouco provável nesse momento. Mas o fato de empresas desse perfil multiplicarem-se mostra que os bancos comerciais “tradicionais” terão que se adaptar mais hora ou menos hora. Vejamos, o caso do Nubank, por exemplo, uma das fintechs que mais se destacaram no setor financeiro.

A empresa trabalha com um produto que existe em praticamente qualquer banco, mas aposta na experiência do usuário – que acontece majoritariamente online – para concorrer com outras instituições.

Porém, veja que o objetivo aqui não é exatamente fazer frente aos bancos, mas oferecer alternativas para problemas que os clientes frequentemente encontram nessas instituições. Entre esses problemas estão usuários que não conseguem aproveitar bem os serviços bancários por não terem como comprovar renda ou porque moram em regiões desprovidas de agências ou caixas eletrônicos.

Por outro lado, o número de aparelhos celulares no Brasil ultrapassa os 215 milhões (mais do que o número de brasileiros). E o número de aparelhos com acesso a internet ultrapassa os 100 milhões – e cresce a cada dia que passa. Portanto, os serviços financeiros online ganham cada vez mais espaço.

E é importante destacar que não é que esses recursos já não tenham sido estudados ou ao menos cogitados antes do fenômeno das fintechs. É que os bancos, pela estrutura consolidada e tradicional da qual dispõem, tiveram outras prioridades. Logo, aplicativos ou plataformas na web sempre estiveram mais para recursos adicionais do que para diferenciais.

O que podemos afirmar com toda certeza nesse momento é que estamos assistindo a uma mudança significativa no setor. E ainda que os bancos tradicionais não estejam com fim decretado, os seus modelos de negócios terão que se adaptar.

Essa é a essência da inovação: a famosa “destruição criadora”.

Dúvidas, críticas ou sugestões? Fale com a gente.

Esse texto também foi publicado no Portal Terraço Econômico.

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